Mais Gaudérios com a certificação da Iron Butt Association - por Renato Lopes

Tudo começou em razão da viagem planejada ao Ushuaia (ARG) e Punta Arenas (CHI) para fevereiro de 2004, que realizei com juntamente com os Gaudérios  Jeferson, Juan, Sendtko e Steglich. (leia o relato do Sendtko).

Particularmente eu precisava testar minha capacidade física, e no final de novembro de 2003, em uma conversa informal com um Aspirante a Gaudério e companheiro de trabalho, Cap Bastianello, falei da idéia de fazer a prova Saddle Sore 1000 da Iron Butt Association para verificar minhas reais condições físicas de resistência a uma viagem de longa distância e tempo. De pronto, com é característico do Bastianello, pela vibração, disposição e gosto por viagem de moto, “escalou-se” para fazer a prova que eu já estava determinado a fazer.

Eu já tinha tudo planejado na mente, conhecia a estrada, as distâncias,  e o Gaudério Passos já havia alcançado-me todas as informações necessárias, e após relatar a minha proposta, foi só colocar no papel, marcar a data,  e executar a prova. Pensando assim, até parece fácil!

Esta prova, Saddle Sore 1000, que significa percorrer 1000 milhas (1609 Km) em até 24 horas, pilotando uma motocicleta, me pareceu a melhor forma de fazer um teste efetivo de resistência, um desafio que poucos se aventuram a realizar, em razão do elevado esforço físico para suportar a longa distância a percorrer, do tempo limite e do enfrentamento de intempérie solitariamente na motocicleta.

Marcada a data para o dia 27 de dezembro de 2003, às 00:06 minutos partimos do Posto Santa Maria Pneus, na rótula da Av. Medianeira com Av. Ângelo Bolson. Nossa partida foi marcada pela presença, pela palavra amiga de incentivo, apoio, a torcida pelo sucesso do desafio e solidariedade de muitos Companheiros Gaudérios,  dos familiares que preocupados, davam suas últimas recomendações, notadamente sobre a segurança, e de muitos amigos importantes que nos prestigiaram. Todas as palavras e vibração de entusiasmo, que tenho plena segurança, partiam com carinho do coração e da amizade sincera,   foram gravadas com muito carinho em nossas mentes.

O percurso da prova foi: Santa Maria (BR 392), São Gabriel, Rosário do Sul (BR 290), Livramento (BR 153 e BR 293), Rivera – URUGUAI (RUTA 5) até Montevidéu, retornando pelo mesmo itinerário.

A escolha do percurso  foi fundamental, estradas boas no Brasil e ótima no Uruguai, sem muito trânsito, acostamento regular, bem sinalizada, o que nos permitiu manter uma boa média de velocidade. Nosso planejamento previa a chegada em Montevidéu em torno das dez horas da manhã, razão de que percorreríamos as primeiras seis horas à noite. E tudo correu bem, concluímos 50 % da prova no tempo estimado, dez horas. Na capital Uruguaia, após o abastecimento das motos e colhermos os comprovantes necessários para formação do processo a ser enviado a Iron Butt Association, encontramos no mesmo Posto de Serviço, dois Policias da “Polícia Caminera”, com os quais mantivemos uma boa conversa sobre a nossa prova-aventura e sobre o país deles, enquanto descansávamos por uns trinta minutos. A atenção  e educação com que fomos recebidos, levou-nos a registrar esses momentos com algumas fotografias.

Prontos para o retorno iniciamos novamente a viagem, eu e o Bastianello estávamos muito bem fisicamente, estávamos “inteiros”, suportando bem a exigência da viagem. Mas quando passamos por Florida, a 85 Km de Montevidéu, o “bicho” pegou, pois o tempo que estava nos ajudando, temperatura agradável em torno de 18 graus, começou mudar rapidamente, caiu a temperatura abruptamente, e olhando para a esquerda que vem de Montevidéu, o azul limpo do céu passou a ficar escuro, com nuvens carregadas e em rápidos movimentos trazia um “temporal”, “sempre da Argentina”, que passou a nos acompanhar até o final da viagem. Paramos em um abrigo de ônibus existente próximo a cruzamento com uma via secundária, o  Bastianello colocou a roupa protetora de chuva e polainas na botas, eu como já estava com roupa de proteção impermeável, foi só colocar as luvas e seguir em frente.

Após rodarmos aproximadamente uns 70 km a chuva nos alcançou, no início sem muita intensidade, o que nos permitia manter uma boa velocidade, estávamos com pneus novos, e a pista é ótima.

Quando passamos por Passo de Los Toros, a chuva começou a cair com muita intensidade, dificultando muito a pilotagem e impondo uma brusca diminuição da velocidade, mas assim fomos até Rivera, onde tínhamos que entregar o “permisso” na Aduana que fica bem no itinerário.  Os tramites foi rápido, mas quando nos preparávamos para cruzar a fronteira e retomar a estrada, iniciou uma forte chuva com ventos de mais de 70 km/h  que inundou as ruas de Rivera, fazendo com que retardasse nossa saída da Aduana, ficamos por mais de 30 minutos no local. Quando a diminuiu, pegamos as motos que estavam na rua em frente a Aduana com água ao nível das calçadas, e seguimos pela Rua Sarandi, onde enfrentamos mais um desafio, em um dos cruzamentos  mais parecia um rio, e por alguns momentos pensamos não ser possível passar, eu e o Bastianello conversamos e como não tinha jeito, decidimos passar. Colocamos a primeira marcha e aceleramos, passamos com o nível da água na altura do motor, e felizmente as motos mais uma vez resistiram.

Logo que entramos na BR 293, na saída de Livramento, enfrentamos uma chuva “torrencial” com forte vento lateral vindo do oeste, onde encontramos vários eucaliptos de mais de cinco metros tombados ao longo da estrada, inclusive na faixa de domínio. Sem dúvida foram momentos de maiores riscos. Se viajar com chuva forte é quase impraticável, imagine com chuva e forte vento lateral, com visibilidade mínima e à noite. Mas  resolvemos continuar mesmo que rodando apenas 30 a 40 km/h, como não sabíamos quando a chuva pararia, ao menos estávamos  ganhando alguns km, e foi assim até Rosário do Sul, quando paramos para efetuar o último abastecimento nas motos,  projetamos nosso tempo em razão dos 225 km restantes, verificamos que era possível concluir a prova mesmo a velocidade reduzida, resolvemos descansar por uns 40 minutos, estávamos exaustos, pois a chuva e o vento nos exigiu toda a concentração possível e imaginária.

Saímos de Rosário do Sul com chuva e chegamos no final da prova, de volta a Santa Maria com chuva, neste trecho, um pouco mais  fraca, mas com o vento ainda forte em alguns trechos.

Todas essas dificuldades, seguramente motivou um atraso de aproximadamente 3 horas e meia em nosso planejamento, mas como tínhamos umas 4 horas extras, o atraso não inviabilizou  nosso objetivo, e concluímos a prova  Saddle Sore 1000 da Iron Butt Association no tempo de 22 horas e 59 minutos, com 1.675 km percorridos.

Nossa chegada foi no mesmo local da partida, e lá estavam nossos familiares e amigos Gaudérios para nos recepcionar, mesmo naquela noite chuvosa, com muito entusiasmo e alegria pela nossa conquista, ávidos por  saber tudo sobre a viagem. Foi um momento especial em nossas vidas, pois depois de uma viagem que exigiu toda nossa força física e mental, receber o carinho e o calor dos familiares e amigos irmãos de estradas, é momento para não se esquecer jamais.

Em todos os momentos, na solitária pilotagem da moto, no solitário pensamento, no cansaço físico e mental que se acumulava, das perguntas que surgiam a todo o momento em nosso pensamento, sempre mantivemos a crença,  éramos capazes de vencer. E nosso otimismo foi nossa fé em ação.

Agora que estamos recebendo nossos certificados da  Iron Butt Association, que possui sua sede na cidade de Lisle, Illinois, nos EUA, como integrantes deste seleto grupo mundial de motociclistas, queremos partilhar esta conquista com nossos amigos apoiadores, especialmente os Companheiros da Associação Motociclística Gaudérios do Asfalto de Santa Maria – RS, da qual tenho o grato prazer de fazer parte.

Obrigado e um fraterno abraço gaudério!

J. Renato Pereira Lopes

Santa Maria, RS – BR, Jul 2004

Nome: J. Renato Pereira Lopes
Moto: Suzuki GSX 750 F - 2001
Profissão: Policial Militar
Idade: 46

Nome: Cleberson Braida Bastianello
Moto: Suzuki GS 500 E - 2002
Profissão: Policial Militar
Idade: 29